Crônica da autora mais experiente da Terra Redonda Editora.
Por Lygia Alli
Hoje é a terceira vez que tento contar o que me aconteceu. Depois que o texto estava pronto, fui salvá-lo nos “Meus Documentos”, me atrapalhei e perdi tudo. Novamente, idem. Ainda bem que havia só duas linhas. Agora, será melhor esperar pela minha filha Vera Regina, que entende bastante desse não tão moderno computador. Escrevo e esperarei por ela.
Queria registrar um fato interessante, pelo menos para mim. Na minha adolescência, embora já formada normalista, tive um grande e precioso amor, que guardei no coração e na memória por anos e anos... bota anos nisso. Era a afeição sincera e a mais incrível por um bebê loirinho e lindinho, filho caçula de uma família que havia, há pouco tempo, se transferido de São Paulo para a minha Cafelândia. Por acaso, a casa deles era exatamente vizinha da nossa e foi assim que o conheci. E nunca o esqueci.
Foi lá também, nesse tempo, que conheci o jovem por quem me apaixonei. Era o Alli. Boa pessoa, bom caráter, ótimo humor. Sempre foi assim.
Porém, começando o namoro, justamente agora? Meus pais conseguiram remoção (os dois eram funcionários do Estado) para Itapira, próxima de Lindoia. Meus pais procuraram um clima mais ameno que o da Noroeste, pela saúde da minha mãe. Lembro vagamente da despedida que fizeram no clube, para homenagear meus pais e que eu chorei...
Foi então, morando na nova cidade, que comecei com a minha carreira de professora. Escolhi, por concurso público, uma escola em Cândido Mota e, mesmo à distância, o namoro continuava firme. Noivamos, praticamente por cartas, pois ele foi transferido para Recife, para instalação do primeiro banco paulista em Pernambuco. O casamento realizou-se em Itapira e, em seguida, fomos morar na Capital pernambucana, por quase 3 anos. Voltamos para Sorocaba, onde os filhos cresceram e estudaram e onde reatei minha carreira, até me aposentar, aos 50 anos.
De Sorocaba, finalmente para a Capital, onde meus pais já moravam. Hoje, todos os filhos moram nesta agitada e ótima cidade, inclusive três netas. A quarta mora em Atibaia.
Continuemos. Em São Paulo, conhecemos os Panetones Bauduco e Di Cunto. O nome me surpreendeu: era o nome da família do Marcelinho, o menininho lindo de quem nunca mais tive notícia. Descobri na lista telefônica o nome da família do Restaurante! Di Cunto; lá fomos nós, W. Alli e eu, atrás deles... ótimo restaurante, de alto nível. A moça com quem conversamos nos informou que Lia, a filha mais velha daquele casal maravilhoso, nossos vizinhos em Cafelândia, tomava conta de tudo, mas estava ausente (parece-me que adoentada) e não soubemos nada da família...
E o tempo passou... Tínhamos ainda ligação com Sorocaba. Eram idas e vindas, eram viagens para o Sul, para o Norte ou ocasiões de meu marido ter ficado doente. Eram visitas ao HC ou do próprio HC em casa.... Veio a falecer em 2016. Foram quase 63 anos de um feliz casamento. Sofri muito sua falta e tenho muita e muita saudade!
E, de repente, sozinha com meus pensamentos, viajando pelo idos de Cafelândia, lembrei daquele fofo menininho. Quantos anos se passaram? Uma eternidade! Que seria feito dele?
Neide Cunha, a única amiga sobrevivente daquela época, me contou que eles haviam se mudado há anos e que o Dr. Carlos havia falecido. Nada mais. E pensa, pensa... Telefonei novamente ao restaurante supostamente deles. Os donos eram outros, o nome era conhecido, mas só como os antigos donos. Eu insisti e a funcionária que me atendeu passou a ligação para um tal de Cláudio... que ufa! que sorte! tinha o número do celular muito antigo do !!! Marcelo. Foi uma delícia! Achei o meu queridinho! Sabe quantos anos se passaram? Quantos? Setenta anos!
Agora é esperar passar a pandemia para que ele venha, como prometeu, me visitar. Ele gostou dessa história, que faz parte da minha memória. Já comprou o livro que escrevi para comemorar meus 90 anos. Ele vai encontrar uma velhinha, velhinha, bem enrugadinha, mas quê vou fazer? A memória é boa ainda... As vezes falha e dá cada encrenca, mas no geral está tudo bem no reino da Dinamarca. Vamos aguardar. Já avisei à minha família, para que participe desse encontro surreal. Não o é? Que história!
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Lygia Alli tem 90 anos e é autora de Poemas e Crônicas da minha vida, livro publicado em 2020 pela Terra Redonda Editora.
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